Oliver Blume, de 57 anos, não resistiu aos maus resultados da Porsche, marca que passou de joia da coroa da indústria automóvel alemã a empresa problemática em apenas dois anos. Provam-no o abandono do Campeonato do Mundo de Resistência (WEC) em 2026, devido ao custo do programa. Ou o anúncio, sob a forma de alerta, emitido a 19 de setembro de último, de que a margem de lucro deste ano, na hipótese mais otimista, seria de 2%, devido a combinação de fatores com impactos negativos nos resultados – caso do abrandamento muito expressivo das vendas na China, do aumento das taxas aduaneiras nos EUA, e do retrocesso no processo de eletrificação, decisão com custo avaliado em cerca de 1,8 mil milhões de euros.
Confrontada com esta situação, e pressionada pelos acionistas, a administração da Porsche, sem surpresa, decidiu mudar de liderança. A 1 de janeiro de 2026, Oliver Blume, depois de dez anos ao leme de um fabricante que perdeu 50% do valor em bolsa desde 2022 – e, por isso, perdeu, também, o invejado título de construtor europeu mais valioso –, abandonará a direção-executiva e a presidência do conselho de administração, e poderá concentrar-se apenas no Grupo Volkswagen, que comandará durante mais cinco anos, até 2030 (funções que acumulava há três anos).
O seu sucessor chama-se Michael Leiters, tem 54 anos, foi contratado à divisão automóvel da McLaren, mas não é um nome novo na Porsche. Já tinha trabalhado na marca de 2000 a 2013, e comandou o programa de desenvolvimento do primeiro Cayenne Hybrid antes de assumir a liderança das duas gamas SUV da Porsche, os produtos por detrás do sucesso financeiro que permitiu a manutenção da produção do seu automóvel mais emblemático, o 911.
De 2014 a 2022, este engenheiro anos comandou o departamento tecnológico da Ferrari, e participou na criação de diversos superdesportivos muito bem-sucedidos da casa de Maranello, nomeadamente nos primeiros equipados com motores de combustão apoiados por motores elétricos: SF90 Stradale e o 296 GTB (é-lhe creditada, também, participação no arranque dos projetos Purosangue e Ellectrica). A 1 de julho de 2022, assumiu a direção executiva da McLaren, cargo que abandonou, premonitoriamente, em abril, não tendo conseguido recuperar a empresa como ambicionava, mas devendo-se-lhe os lançamentos do 750S e do Artura, por exemplo, mais a criação das bases para a produção do primeiro SUV.
Nestas suas duas funções, em Itália como em Inglaterra, o alemão também foi obrigado a trabalhar em planos de reestruturação. Já na Porsche, as prioridades imediatas serão repensar o plano de investimentos em modelos novos, e em motorizações elétricas e eletrificadas, e eliminar quase 4000 postos de trabalho. Wolfgang Porsche, Presidente do Conselho de Administração da Porsche AG, explicou esta escolha. “Tem muitas décadas de experiência na indústria automóvel. O estilo de liderança e o conhecimento técnico são pré-requisitos essenciais para ser bem-sucedido numa empresa que conhece bem”. E agradeceu e elogiou o contributo de Oliver Blume: “Assumiu o comando em tempos difíceis, e fê-lo com competência, responsabilidade e resultados”.
Oliver Blume, na hora do adeus, recordou o percurso de dez anos na Porsche, e reconheceu que as mudanças no automóvel exigem “sangue novo” no comando da empresa: “Mudanças significativas nos nossos maiores mercados, a China e os EUA, tiveram impactos negativos no nosso modelo de negócio. Por isso, já este ano, iniciámos programa de reestruturação, e adaptámos a estratégia de produto. Deixo a companhia preparada para o futuro. Mantenho-me no grupo, e pretendo continuar a acompanhar esta marca”.
O Grupo VW, o maior construtor automóvel europeu, só na Alemanha, pretende eliminar 35 000 postos de trabalho até 2030. Para os analistas, a mudança no comando da marca antecipava-se. E os acionistas aplaudiram: “Finalmente, reagiu-se às críticas, e reagiu-se bem”, afirmou Hendrick Schmidt, da DWS, entidade que detém participação importante no capital do construtor. Em bolsa, depois deste anúncio, valorização das ações tanto da Porsche (1,2%), como do Grupo VW (1,7%).